- Ora, Thaís, não sabe que o velho do saco é malvado? Ele come criancinhas de almoço e lixo de sobremesa. Sabe o que tem dentro daquelas grandes sacolas? Não são restos de lixo, não. São ossos de gente; de humanos que ele comeu!
- Mãeeeeeeeeeeeeeeeeee! – gritou a menina, correndo para o quarto dos pais, com medo da história apavorante que o irmão contara.
O que nenhum deles sabia era o que realmente acontecera com o “Velho do Saco”. Sim, aquele do lado de fora de casa, fuçando na lata de porcarias como um animal faminto a procura de sobras.
Antigamente, os pobres velhinhos “saquistas” sofriam nas mãos das crianças que vinham atirar-lhes pedras, zombar de suas feiúras e fugir como covardes depois. Raramente conseguiam um bom resto de comida para sobreviver, porque havia sempre misturas nos lixos: carne com papel higiênico usado, restos de sabão no molho, frauda de bebê com refogado de frango... coisas do gênero.
Um dia, cansados dessa vida de poucas sobras, os barbas mal feitas organizaram um encontro no Lixão Abandonado de Caratapado, para unirem-se contra o mundo que tanto os odiava e criava mitos. Montaram uma base secreta no lixão chamada Área 91, um esconderijo para orquestrarem seus planos de dominarem o mundo. Lá tinham todo o material para montar intercomunicadores e armas contra pivetes (fundas, munição de restos de comida, catapultas... os peidos fedorentos, já estavam incluídos no pacote), utensílios de defesa e sobrevivência. Estavam prontos para a batalha!
Os líderes do movimento “O Saco Não Tem Crianças” começaram a fazer protestos frente ao governo exigindo alguns direitos:
-Acabem com o preconceito das crianças, façam a seleta dos lixos! Queremos ganhar sacos mais resistentes que estes!
Com entrevistas na TV e tudo que se tem direito, os candidatos a nova presidência começaram a prometer inclusão social para os Do Saco, além de Bolsa Sacola e apetrechos de defesas marciais.
O presidente Erradinho Portuguesinho venceu a eleição e criou uma companhia de vendas de mochilas ultra-resistentes para os barbas mal feitas passearem pelas ruas sem problemas. Com o impulso desse novo negócio, abriram muitos outros como o desodorante de pum-cheiroso, organizador de lixão multifuncional, aparador de barba fedorenta 4.5, espanta pivete 2000, e vários outros produtos para os Do Saco.
Tudo ia muito bem, até que uma empresa multinacional passou a vender mochilas de plástico durável, que segundo eles era um novo símbolo de avanço na modernização.
“Está na moda, todo mundo usa!” Diziam eles, em suas propagandas; entretanto os sacos começam a se rasgar com facilidade e os pobres velhinhos a comprá-los cada vez mais. Os restos de material inutilizado foram parar nas valas dos rios poluindo o ambiente, a tal ponto, que o Green-nunca-suje-aqui passou a persegui-los por proliferar sacos não biodegradáveis.
Tudo foi tirado deles novamente. Devolveram-lhes os sacos remendados e usados, o presidente Erradinho Portuguesinho cortou os projetos de inclusão socio-barbal e Bolsa sacola. Os “velhos do saco” voltaram às ruas hostis, aos lixos misturados e ao antigo mito de comerem crianças inocentes com lixo de sobremesa.
Autor: Míriam Coelho